“Da superfície ao
horizonte: visualidades em trânsito”,
A mostra reuniu trabalhos de artistas
que integram um grupo constituído, na sua origem, pela busca da experiência
coletiva. Nela o trabalho é o lugar de trocas, da soma, do diálogo, do avanço e
do recuo, movimentos para encontrar à medida que possa revelar um corpo
pictórico encarnado na espessura reduzida. Trama de camadas para gerar visualidades onde
pulsam muitos fazeres. São fazeres que remetem para visualidades pontuais da
história da pintura onde ações de manchar, escorrer, decalcar, gotejar,
contornar, respingar, tonalizar impregnadas de acaso revelam estados variados
da matéria.
A produção daquele estágio se pauta por
processo de interação de muitas mãos que agem e reagem sob olhares que se movem
entre o que se dá a ver e o que aponta para novas possibilidades. As ações se desenvolvem
se elegem na busca desse corpo que progressivamente alcança novos níveis de
densidade, agrega vontades, traduz a competência de cada um. Os integrantes
atuais do grupo vieram da pintura, mas se movem pelo desenho, encontram ecos da
pintura na visualidade da natureza, nas manchas que expandem por passagens
suaves que habitam a superfície configurada por quase mapas. Olham para a
natureza, observam a decadência da arquitetura. Descobrem encanto no material
do desenho usado pelas crianças que liquefeito despenca em gotas que de distâncias
controladas explodem no impacto com a superfície sob a ação da gravidade. A
grade nervosa dos escorridos passeia pela superfície da trama da tela deixando
rastros cheios de tempo que se alternam por vazados e se conduzem pela ação da
gravidade dando ritmo ao olhar.
A pintura pensada como resultado de um
diálogo de várias vozes é, na velha superfície do quadro, o lugar para mais um
desafio. Orquestrar vontades, ajustar visualidades. As implicações dessas
escolhas podem ser aquilatadas se considerarmos que o processo solitário de um
artista diante da tela em branco é sempre desafiador: Tudo é possível, tudo
está porvir! No coletivo essas possibilidades crescem e se colocam num
intrincado processo de propor, acolher, dialogar, fazer por partes,
acrescentar, retroceder, avançar, observar, ceder – tecer. Pintar é aqui é tramar.
A pintura como trama é um corpo sob a
pele da aparência/transparência cujo tônus se revela por camadas de topografias
irregulares; ora mais ora menos visíveis. Efeitos de percurso que não obedecem
a uma organização regular e previsível. Tecedura complexa de amarração para
adensar o corpo, sem, entretanto opacificar a carne da pintura, corpo exposto.
A trama é densa, mas a visibilidade pode ser recuperada a cada movimento do olhar.
Espessura rasa – paradoxo necessário para um corpo que resiste a abandonar a
superfície. Não a conquista de fato, mas também não a perde de vista.
A aparência do resultado é uma espécie
de armadilha. Às vezes nos dá a pista das múltiplas direções que os diversos
olhares contribuíram para constituir, mas logo em seguida volta a nos colocar
num labirinto que incita à dúvida, mas recomeçar é impossível. Mover-se é a
opção. Ir em frente.
Curadoria: José Luiz Pellegrin
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